segunda-feira, 18 de maio de 2015

AVALIAÇÃO NA ALFABETIZAÇÃO


Como vimos no texto anterior, até meados da década de 1980, as práticas de alfabetização se baseavam em métodos considerados hoje como “tradicionais”, que tornavam artificiais as práticas escolares da leitura e da escrita. Liam-se e escreviam-se palavras, frases e textos “cartilhados” (considerados pseudo textos) com o objetivo de aprender “o código” alfabético. Atreladas a essas prá- ticas de alfabetização desenvolvidas na 1º série do Ensino Fundamental observávamos a realização de práticas de avaliação nomeadas hoje como tradicionais, cuja ênfase era na medição/mensuração das aprendizagens dos alunos e na classificação deles como aptos ou não aptos para progredir no ensino. Antes de iniciar o processo formal de alfabetização, era preciso avaliar se os alunos apresentavam a “prontidão” necessária para tal processo, relacionada ao desenvolvimento de habilidades “psiconeurológicas” ou “perceptivo-motoras” (coordenação motora, discriminação auditiva e visual, etc.). Com a elevação do índice de repetência na 1ª série do Ensino Fundamental da escola pública, vimos surgir programas de Educa- ção Compensatória que tinham o objetivo de preparar os alunos, na Educação Infantil (denominada de pré-escola na época), Eliana Borges Correia de Albuquerque para o início do processo de alfabetização, compensando as supostas carências culturais, deficiências linguísticas e defasagens afetivas que esses alunos – provenientes das camadas populares – apresentavam (KRAMER, 2006). 

Considerava-se, naquele contexto, que as crianças que ingressavam no Ensino Fundamental não possuíam conhecimentos sobre a língua e, ao mesmo tempo, julgava-se necessário que todas elas tivessem desenvolvido uma maturidade para aprender a ler e escrever relacionadas com as habilidades anteriormente mencionadas. Uma vez diagnosticado que elas estavam “aptas” para iniciar esse processo, cabia ao professor, que seguia um determinado método, apresentar as unidades sonoras (sílaba, fonema) em uma sequência pré-estabelecida, unidades estas que deveriam ser memorizadas pelos alunos. Como abordado por Albuquerque e Morais (2006, p. 129), “Os diferentes métodos controlavam e garantiam a aprendizagem quando existia prontidão. 

O controle era feito a partir da apresentação das unidades que deveriam ser memorizadas – letras/fonemas/padrões silábicos, no caso dos métodos sintéticos, ou textos/frases com um repertório de palavras que deveriam ser memorizadas, no caso dos métodos analíticos – sempre com base em uma sequência a ser seguida. O aluno só poderia ser apresentado a novas unidades uma vez que tivesse memorizado as anteriores. “ Nessa prática de ensino da leitura e da escrita, a avaliação era fundamental para o bom andamento do processo. Avaliava- -se se os alunos estavam aprendendo o código alfabético na perspectiva da memorização das unidades apresentadas/ ensinadas pelo professor e presentes no livro didático utilizado. O objetivo de tal avaliação era o de medir e classificar a aprendizagem dos alunos para determinar seu prosseguimento nos estudos, tanto no que se refere à sequência de apresentação das lições/unidades ao longo do ano, como à passagem para a 2ª série. O propósito classificatório e seletivo de tal prática de avaliação evidencia-se nos altos índices de reprovação no final da 1ª série. Ainda em relação a tais práticas de alfabetização e avaliação, presentes na memória de muitos de nós, avaliava-se por meio de atividades que exigiam a leitura e a escrita das letras, sílabas, palavras, frases e textos trabalhados. Era preciso garantir que os alunos dessem as respostas corretas, uma vez que o erro precisava ser evitado, pois era indicador de que o estudante não havia aprendido/memorizado o que fora ensinado. Como abordado no primeiro texto deste caderno, tal prática de avaliação era excludente, pois desconsiderava o sujeito em suas singularidades e não considerava suas experiências/conhecimentos prévios, assim como seus percursos de aprendizagem. Os educandos, ao final do ano, eram apenas rotulados em aptos ou não aptos a prosseguir os estudos, estando tal aptidão relacionada ao desempenho deles nas tarefas/provas escolares e a suas capacidades de emitirem as respostas corretas. 

A partir da década de 1980, o fracasso escolar que até então era visto como um problema de deficiência ou carência cognitiva e cultural dos alunos do meio popular, passou a ser relacionado, à luz das teorias construtivistas e sociointeracionistas de ensino (em geral) e da língua (em particular), às práticas tradicionais de ensino da leitura e da escrita. No campo da alfabetização, como vimos anteriormente, os trabalhos de Emília Ferreiro e Ana Teberosky vão dar um novo sentido aos erros ou escritas não convencionais dos alunos, que passaram a ser vistos como reveladores de suas hipóteses de escrita.

Como abordado por Albuquerque e Morais (2006), diferentemente de uma prática tradicional de alfabetização e avaliação, na perspectiva construtivista e interacionista de ensino, e também na perspectiva inclusivista, avaliam-se as conquistas e as possibilidades dos estudantes ao longo do ano escolar, e não apenas os impedimentos e as condutas finais e acabadas. O erro, que antes precisava a todo custo ser evitado, já que era o principal sintoma de exclusão escolar, passa a ser considerado como indicador da forma como os alunos pensam sobre determinado conhecimento. Os objetivos das avaliações não se relacionam mais à simples medição de conhecimentos para determinar se estão aptos a progredir nos estudos, mas à identificação dos conhecimentos que os estudantes já desenvolveram, com o objetivo de fazê-los avançar em suas aprendizagens. 

Nessa perspectiva, avalia-se tanto os alunos, para mapear seus percursos de aprendizagem, como as práticas pedagógicas com o objetivo de analisar as estratégias de ensino adotadas de modo a relacioná-las às possibilidades dos educandos. Como abordado por Ferreira e Leal (2006), “é papel de a escola ensinar, favorecendo, por meio de diferentes estratégias, oportunidades de aprendizagem, e avaliar se tais estratégias estão sendo de fato adequadas” (p. 16). Na unidade 2 o planejamento do ensino é discutido, a partir do pressuposto de que é a avaliação que fornece informa- ções sobre quais são as prioridades a serem consideradas no planejamento e sobre como agrupar os estudantes em sala de aula. Quanto ao registro dessas avaliações, pode- -se também propor diversificação quanto aos instrumentos: cadernos de registros dos estudantes; os portfólios com a coletânea de atividades/registros realizados pelas crianças ao longo de um determinado período que permitem que tanto o professor como os próprios alunos acompanhem as dificuldades e os avanços em uma determinada matéria; a ficha de acompanhamento individual (de cada aluno) e coletiva (da classe).

Para isso, é essencial a realização de uma avaliação diagnóstica no início do ano, para que o perfil da turma seja traçado e a professora possa, juntamente com a equipe, pensar nas estratégias de ação relacionadas à alfabetização. Tal avaliação também acontece ao longo do ano e, com base nela e nas atividades desenvolvidas diariamente, a docente preenche um quadro de registro de cada aluno, de modo a poder acompanhar os avanços de cada um nas diferentes áreas. Por meio de tal quadro é possível, também, analisar o baixo rendimento dos alunos de modo a pensar nas soluções para que efetivamente eles aprendam. Pode-se, por exemplo, realizar mudanças na organização de estratégias didáticas, com a possibilidade de acompanhamento individual do aluno pelo professor em alguns momentos e por outro profissional da escola (coordenador pedagógico, estagiário, etc.), em outros momentos. Por fim, é importante considerar que as mudanças nas práticas de alfabetização e avaliação foram acompanhadas também de mudanças na organização de alguns sistemas de ensino em regimes ciclados. No Brasil, foi a partir da década de 1980, como forma de diminuir o gargalo na 1ª série do Ensino Fundamental, que a organização curricular em ciclos passou a ser instituída. 

Enfim, na perspectiva da inclusão que norteia a proposta da organização escolar em ciclos é fundamental que os sistemas de ensino (seriados ou ciclados) estabeleçam o que deve ser ensinado em cada ano escolar e construam estratégias didáticas para que os estudantes progridam em seus conhecimentos, respeitando-se a heterogeneidade do grupo. É necessário pensar também em formas de acompanhamento daqueles que não alcançaram as metas pretendidas para o ano e que vão prosseguir em seus estudos, de modo a garantir que não sejam excluídos do grupo. Algumas escolas e redes de ensino têm adotado estratégias relacionadas ao desenvolvimento de projetos de acompanhamento aos alunos com defasagem de aprendizagem, projetos esses que são realizados por parte de um grupo de professores ou estagiários em determinados horários da semana ou no contra turno. 


Disponível em: http://pacto.mec.gov.br/images/pdf/Formacao/Ano_1_Unidade_1_MIOLO.pdf. Acesso em: 17/05/2015.

Imagem disponível em: http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/ajudar-alfabetizacao-seu-filho-470463.shtml. Acesso em: 17/05/2015.

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