sábado, 12 de setembro de 2015

ALFABETIZAÇÃO NA PEDAGOGIA WALDORF



Salas de aula sem mesas e cadeiras, onde os alunos não são obrigados a copiar o que o professor escreve na lousa, muitos trabalhos artísticos, pinturas nas paredes e poucas letras ou números por perto. Assim são as escolas Waldorf. Sua maior força reside em apostar no lúdico e deixar a criatividade da criança correr solta.
Em outros métodos de ensino, principalmente os mais tradicionais, o grande aliado dos iniciantes na escrita é o caderno de caligrafia. Aqueles que não conseguem escrever o nome naquele no espaço definido entre duas linhas da folha podem ter a letra classificada como garrancho. O mesmo processo não acontece com quem é aluno do método embasado nos estudos antroposóficos do austríaco Rudolf Steiner.
Segundo seus ensinamentos, a alfabetização só pode ser iniciada após os sete anos e a função principal da escola, sobretudo nesse período inicial, é estimular o pensar criativo e artístico. “A criança aprende através do brincar, que é uma ação criativa. O tempo da criança é o da fantasia. Ela brinca o tempo todo. Por exemplo, se ela pega um chuchu e espeta nele um palito de fósforo, o chuchu vira um porquinho ou uma vaquinha”, conta o médico e docente da formação em medicina antroposófica, Rômulo de Mello Silva.
“Um pensar intelectual morto sem fantasia e sem invenção não serve. É um pensar que copia e repete. A formação do ser humano deve ensinar a ser livre”, diz ele.
No encontro que abordou as contribuições da neurociência para a pedagogia Waldorf, parte do Ciclo de Encontros com a Educação organizado pela Sociedade Antroposófica no Brasil, inúmeras polêmicas sobre os métodos de ensino foram discutidas.

Etapas evolutivas

Para antroposofia, os três primeiros setênios da vida (0 a 7 anos, 7 a 14 anos e de 14 a 21 anos) possuem determinadas características e o ambiente escolar deve ser moldado levando em conta essas fases. Atualmente, alguns neurocientistas vêm buscando evidências que associam os processos cerebrais com cada período.
Segundo Ricardo Ghelman, médico pediatra, clínico geral e membro da coordenação do Núcleo de Medicina Antroposófica (Numa), “a primeira infância tem uma superprodução de sinapses, que se formam só nesse período da vida: são os neurônios espelho, criados para estimular a prática da imitação”. Ele diz que depois dos 7 anos, eles desaparecem em grande parte.
Para Ghelman e outros antroposóficos, "o segundo setênio de vida se caracteriza pela formação de sinapses na área pré-frontal, a que difere o ser humano dos outros animais. Nessa fase, se estabelecem relações mais afetivas e racionais. Esse período termina mais ou menos aos 12 anos, quando ocorre a mudança hormonal na criança e o cérebro muda”.
“A terceira infância, que vai até os 21 anos, é um período muito importante: o da travessia. O indivíduo que tinha como referencial pai, mãe e educadores vai buscar o referencial de si mesmo", diz Ghelman. "Nessa etapa, só aumentamos as sinapses se nós tivermos interesses e experiências. Por isso, uma pedagogia que estimula o interesse pelo mundo, pelos outros e que utiliza a arte para não engessar, permite que novas sinapses, ou seja, novos cérebros sejam formados.”
O neurocirurgião especialista em medicina antroposófica Maurício Baldissin concorda com ele a respeito de que estímulos adequados devam ser oferecidos em diferentes etapas evolutivas. “Na vida adulta também é preciso manter esses estímulos para produzir melhor resposta imunológica e um número menor de doenças crônicas”, diz ele.

Polêmica: quando começar a escrever?

Estudos feitos pelo matemático e neurocientista francês Stanislas Dehaene, autor do livro Os neurônios da leitura, indicam, por exemplo, que o método mais eficaz de alfabetização é o fônico, aquele que ensina as letras através da correspondência fonética de cada uma delas. Nesse sentido, quanto mais cedo a criança começa fazer essas associações, melhores são os resultados.
A questão do tempo certo para alfabetizar costuma gerar discussões. Estudos feitos pela Unescoindicam que atrasar esse processo pode prejudicar o desenvolvimento escolar. De acordo com o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, do Ministério da Educação, toda criança deve ser alfabetizada até os 8 anos de idade.
Pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão ligado ao Ministério da Educação (MEC), todas as crianças de 4 e 6 anos completos até o dia 31 de março devem ingressar na pré-escola e no ensino fundamental, respectivamente. Isso significa iniciar o processo de alfabetização.
Para os pedagogos ligados às escolas Waldorf, no entanto, como as pessoas se desenvolvem em ciclos de 7 anos, elas começariam a ser alfabetizadas mais tarde do que defendem o MEC e o CNE. Em razão disso, há uma enorme polêmica em torno do assunto.
Para se ter uma ideia do problema, em 2013, o governo de São Paulo estabeleceu uma meta para atingir a alfabetização de todos os alunos do Estado até os 7 anos. Foi criada, inclusive, uma nova prova para alunos dessa faixa, isto é, aqueles que estão cursando o segundo ano do Ensino Fundamental 1. As escolas Waldorf, por sua vez, contestam a decisão de iniciar a alfabetização aos 6 anos, como querem o Ministério da Educação e o governo de São Paulo.
Além de toda a discussão em torno da alfabetização em si, a questão envolve ainda o desempenho. É importante salientar que os cinco primeiros colocados no teste Pisa aplicado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em alunos de 15 anos, de 70 países, são: Xangai, Coreia do Sul, Finlândia, Hong Kong e Cingapura. Nesses países, as crianças, aos 6 anos de idade, já estão todas alfabetizadas.

A teoria e os estudos

A teoria de Rudolf Steiner sobre a alfabetização após o primeiro setênio se baseia no período em que ocorre na criança a troca dos dentes. “Uma vez a federação Waldorf me convidou para buscar argumentos neurológicos contra a alfabetização precoce, porque o MEC (Ministério da Educação) não vai mudar o sistema do Brasil por causa da troca dos dentes. Uma descoberta associada à causa foi que, no sétimo mês da gravidez, ainda no período embrionário, o cérebro começa a receber uma bainha de gordura, a bainha de mielina, que recobre os neurônios. Esse processo dura entre 6 e 7 anos. Portanto, coincide a conclusão do processo de mielinização com o período que o Steiner propôs para a alfabetização”, relata Ghelman. “A alfabetização estimula muito uma parte do cérebro racional, para uma criança com menos de 7 anos, isso leva a um desgaste.”
Baldissin pondera que não existe uma área específica do cérebro para a escrita. “A representação cerebral do processo de escrever forma-se à medida que ocorre a aprendizagem. Essa representação não impregna determinada área do cérebro para formar um ‘centro da escrita’.”
A afirmação entra em choque com alguns estudos realizados na área da neurociência, como os de Stanislas Dehaene e do grupo de pesquisadores que coordenou o trabalho Neuroscience: implications for education and lifelong learningda instituição britânica The Royal Society.

O esquerdo e o direito

O método educacional também pode ser responsável por estimular mais o lado direito ou esquerdo do cérebro. A parte direita é associada à imaginação, criatividade, organização espacial, entre outras características; e a esquerda à lógica e racionalidade, por exemplo.
“A nossa cultura hegemônica é a do cérebro esquerdo. Ser um ótimo aluno em matemática é muito mais valorizado do que ser um ótimo artista. Se pensarmos em qualquer pedagogia que vai contra essa corrente, já é um grande bem para humanidade”, enfatiza Ghelman.
“A neurociência pode ajudar a compreender que o ensino tem uma dimensão muito maior do que apenas o conhecimento”, conclui.
AS ESCOLAS WALDORF
A primeira Escola Waldorf surgiu em 1919, na Alemanha, sob a orientação de Rudolf Steiner. Ela foi criada a pedido de um industrial para atender os filhos dos operários e funcionários da fábrica de que era diretor. Foi uma experiência de sucesso. Hoje as Escolas Waldorf formam uma rede de ensino em crescimento em todo o planeta, presentes nos cinco continentes. E, embora tenham sido criadas na Alemanha, buscam incentivar e incorporar a cultura do país em que se encontram. No Brasil, a primeira Escola foi criada em 1956, em São Paulo. A partir de então, o movimento tem se expandido com novas escolas em Aracajú (SE), Belo Horizonte, Botucatu (SP), Brasília, Curitiba, Cuiabá, Florianópolis, Fortaleza, Friburgo, Juiz de Fora, Ribeirão Preto, Rio de Janeiro, Salvador, entre outras. Não há administração central; cada Escola é independente. Há, contudo, associações que apoiam o movimento, promovendo cursos e congressos de atualização de professores e muitas vezes, ajuda financeira para escolas de poucos recursos materiais. A organização administrativa de cada instituição Waldorf também segue o princípio da autogestão. Não há um único dono ou diretor, mas conselhos . Os professores são plenamente responsáveis pelos seus procedimentos pedagógicos, trabalhando sempre em equipe. Cada escola é representada juridicamente por uma Associação sem fins lucrativos , da qual participam professores, pais, e aqueles que sentem afinidade com os seus propósitos educativos e culturais. Esta filosofia, ou tipo de gestão que dela provém, não muda em nada quaisquer responsabilidades pedagógicas, financeiras ou jurídicas. A Escola Waldorf responde a todos estes níveis, como qualquer outra escola. Os pais e a família têm papel preponderante. 
A PEDAGOGIA WALDORF
A Pedagogia Waldorf é uma pedagogia que tem como ponto de partida o conhecimento da criança e de seu desenvolvimento em diversos aspectos. Enfoca o ser humano como ente físico, anímico e espiritual.
Embasada na concepção de ser humano e mundo desenvolvida pelo filósofo austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), essa pedagogia tem como objetivo o cultivo das potencialidades individuais. Leva em consideração a diversidade cultural e se compromete com princípios éticos humanos amplos e gerais.

Há uma valorização de:
• Integração social e cooperação
• Integração de escola e família
• Infância saudável
• Alegria e responsabilidade nos processos de aprendizagem
• Excelência intelectual, imaginação, criatividade, cultivo da memória, habilidades em resolução de problemas
• Arte e movimento como meios de exercitar capacidades e como elementos que permeiam todo o processo de aprendizagem
• Currículo que propicia um desenvolvimento adequado a cada faixa etária nos âmbitos físico, emocional e cognitivo.
• Professores em permanente processo de autoeducação: além da formação acadêmica os professores passam por uma formação específica em Pedagogia Waldorf.

Especi cidades da Pedagogia Waldorf
• Os conteúdos e atividades visam ir ao encontro das necessidades próprias de cada fase do desenvolvimento dos alunos
• Educação Infantil com espaço e tempo para o desenvolvimento de uma infância saudável, sem procedimentos voltados para a alfabetização precoce
• Os primeiros oito anos escolares do Ensino Fundamental têm, preferencialmente, acompanhamento feito pelo mesmo professor
• Aulas de Euritmia
• Ensino em módulos temáticos
• Aulas de Trabalhos Manuais, Música, Jardinagem, Artes ao longo de todo o currículo
• Ensino de línguas estrangeiras (Inglês e Alemão) desde o primeiro ano
• A avaliação é contínua e diversificada, e considera o aluno em seus diversos aspectos. Pretende ser tanto um retrato da situação de aprendizagem quanto um ponto de partida para desenvolvimentosposteriores
• O elemento artístico, além de ser utilizado como uma faculdade em si, é um veículo didátic

“A nossa mais elevada tarefa deve ser a de formar seres humanos livres que sejam capazes de, por si mesmos, encontrar propósito e direção para suas vidas.” (Rudolf Steiner).


perguntas

1.  O que é Antroposofia ?

Correspondendo às suas raízes linguísticas, a palavra  Antroposofia   (do grego Antropos – Homem e Sophia – Sabedoria) significa sabedoria a respeito do homem. Elaborada, em seus princípios, pelo filósofo e cientista austríaco Rudolf Steiner (1861-1925), procura satisfazer a busca de conhecimento do homem moderno a respeito de si mesmo, buscando responder recorrentes perguntas do ser humano: Quem sou eu? De onde venho? Para onde vou? Qual é o sentido de minha existência?
Além da Pedagogia Waldorf, praticada em mais de 650 escolas em todo o mundo, a Antroposofia trouxe  bases científicas para uma renovação nas diversas áreas da vida social, como  a Medicina, Artes, Agricultura Biodinâmica, Terapias, Educação Especial, e muitas outras. (Veja mais no site: www.sab.org.br ).
2. Ao sair do Colégio Rudolf Steiner meu filho terá dificuldades em adaptar-se a outras escolas ou ao mundo?
A prática e relatos mostram que as crianças transferidas para outras escolas normalmente conseguem bom desempenho e boa adaptação. Frequentemente se sobressaem quanto à capacidade de concentração, criatividade, entrosamento social, autonomia e alegria no aprender.
3. O ensino é “mais fraco”, se comparado às Escolas convencionais?
Não. A Escola Waldorf também exige muito dos alunos. A diferença está na forma com que os assuntos são trazidos às crianças, e no respeito às suas fases evolutivas.
4. E o vestibular?
Jovens ex-alunos Waldorf, mostram-se aptos a passar em qualquer vestibular, tanto quanto alunos de escolas tradicionais. Podem tornar-se bons profissionais nas áreas de ciências exatas, humanas, biológicas ou quaisquer outras. Normalmente mostram sensibilidade em relação às questões de ordem social, estando bem conectados à realidade. Enfrentam os desafios da vida com equilíbrio e com os “pés no chão”.
5. Como são feitas as avaliações no Colégio Rudolf Steiner?
O progresso dos alunos é descrito detalhadamente pelos professores, nos boletins anuais. Mais do que notas por matéria, são enfocadas habilidades como perseverança, interesse, motivação e força de vontade. Esse método de avaliação permite um acompanhamento amplo do desenvolvimento da criança. As provas e testes também são aplicados, quando o professor julga necessário.
6. Como se dá o ensino da Informática?
Partindo de um estudo aprofundado a respeito do desenvolvimento do ser humano, constatamos que a criança só deveria utilizar computadores quando, simultaneamente, puder compreender o seu funcionamento mecânico. Tal habilidade surge de forma viva e livre, no terceiro setênio. Essa espera proporcionará ao jovem a capacidade de não se deixar manipular, fazendo uso consciente dos meios eletrônicos, tão importantes na época em que vivemos.
7. Como a questão dos Limites é trabalhada?
O ser humano só alcança sua maturidade aos 21 anos.  A criança gradativamente conquista autonomia, responsabilidade e liberdade.  O limite é imprescindível para a criança em desenvolvimento.
Embora na educação infantil a criança tenha seu espaço de expressão através do brincar espontâneo, existem limites e atividades definidas, ritmo e horários, o que traz segurança para o ambiente.
Do maternal ao ensino fundamental, os limites são claramente colocados pelos professores, em linguagem adequada a cada faixa etária.
8- Como é a alfabetização no Colégio Rudolf Steiner?
Na Escola Waldorf, a alfabetização tem início no Ensino Fundamental, devido ao respeito que se dá a diversos aspectos do  desenvolvimento da  criança, e não apenas o cognitivo ou intelectual.
Atualmente muitas crianças apresentam precocidade no lado intelectual, o que não quer dizer que tenham maturidade para submeter-se a um processo de alfabetização. Muitos problemas futuros podem ser evitados, quando se tem a devida paciência para esperar. Crianças que entram no primeiro ano Waldorf já alfabetizadas têm a oportunidade de conhecer as letras e a escrita de maneira viva e artística o que amplia em muito sua relação com o mundo letrado.
9- Como é tratada a Religião nas Escolas Waldorf?
A Antroposofia não é uma religião. É uma visão do Universo e do Homem obtida segundo métodos científicos. Dessa cosmovisão decorre uma imagem do ser humano, que é objeto de constante estudo para os professores.
Nas Escolas Waldorf, não se prega nenhuma confissão específica, respeitando-se a liberdade espiritual de seus alunos e familiares.
O sentimento de religiosidade, que a criança naturalmente traz consigo, é cultivado na celebração das festas cristãs e também através de pequenos gestos de gratidão aos homens, à natureza e a Deus.
10- Há alguma recomendação da Escola em relação à alimentação?
As crianças devem evitar os doces na parte da manhã, pois o organismo não está apto a digeri-los, o que prejudica a concentração. Na medida do possível, o ideal é receber uma alimentação integral isenta de agrotóxicos.
11- Como é a formação do professor Waldorf?
O professor Waldorf, além da formação tradicional exigida pelo MEC, passa por uma formação específica, que consiste nos Cursos de Formação em Pedagogia Waldorf, com duração mínima de 1600 horas. Fazem parte da formação matérias teóricas como as que tratam do currículo e do desenvolvimento da criança. Filosofia, Arte, História da Arte, Música, Trabalhos Manuais, entre outras.
Entretanto, a formação de todo  professor se completa dentro da sala de aula, no exercício diário da sua missão.
Num mundo onde valores humanos são cada vez menos considerados,  temos a árdua tarefa de lutar contra uma corrente que prega  a  alienação, a massificação de ideias, a falta de sensibilidade. O professor, como agente transformador da sociedade, começa tansformando-se a si próprio.
A relação professor-aluno é o aspecto mais importante para uma educação integral. Informações podem até ser transmitidas por meios eletrônicos. Educação, não.
12- As Escolas Waldorf são reconhecidas pelo MEC?
Sim. E têm suas Propostas Político Pedagógicas avaliadas como uma  das mais completas e adequadas aos novos Parâmetros Educacionais mundiais.
13- Como são administradas?
A organização administrativa de cada instituição Waldorf  segue o princípio da autogestão. Não há dono, mas conselhos.  Cada escola é representada juridicamente por uma Associação sem fins lucrativos, no nosso caso, a Associação Pedagógica Itacolomi, da qual participam professores, pais, e aqueles que sentem afinidade com os seus propósitos educativos e culturais. Esta filosofia, ou tipo de gestão que dela provém, não muda em nada quaisquer responsabilidades pedagógicas, financeiras ou jurídicas. A Escola Waldorf responde a todos esses níveis, como qualquer outra escola.
PEDAGOGIA WALDORF E ALFABETIZAÇÃO
SUELI PECCI PASSERINI – O Estado de S. Paulo
É possível alfabetizar uma criança com menos de 7, 6 ou até 5 anos de idade? Sim, é possível alfabetizar muito cedo uma criança. Mas será uma alfabetização significativa? Que comprometimentos podem advir do que entendemos como aceleração da alfabetização? Qual é o ganho efetivo para a criança?Ouço muitas vezes no consultório os pais preocupados com o futuro caminho profissional definido pelo vestibular de seu filho ou filha de apenas 3, 4, 5 anos. Quando pergunto aos pais o que eles entendem do brincar de sua criança, geralmente respondem que é apenas um passatempo, exceto pelos jogos de raciocínio. Eles consideram importante preparar a sua criança para a vida, para a competição do mundo, para uma profissão que lhe dê “felicidade” – palavra quase sempre atrelada a “dinheiro”.No entanto, se olhamos a criança quando ela está brincando, fantasiando, subindo em árvores ou correndo com outras crianças, verificamos um universo muito particular no qual ela desenvolve capacidades e uma confiança que, muitas vezes, não encontramos no universo dos adultos bem sucedidos. É por esse motivo que nas escolas Waldorf nós defendemos que até pelo menos os 6 ou 7 anos a criança simplesmente… brinque. O tempo que alguns julgam que ela “perde” por não ser rapidamente alfabetizada, ela na verdade ganha, acumulando forças e mecanismos internos para poder enfrentar o mundo que às vezes tanto preocupa os adultos.Há quase 100 anos da fundação da primeira escola Waldorf na Alemanha, cuja concepção, denominada Antroposofia, foi elaborada pelo filósofo Rudolf Steiner, acreditamos cada vez mais nessa prática, hoje disseminada em mais de 3 mil instituições em todo o mundo, orientando educadores quanto a essa questão. A antropologia antroposófica reconhece a importância do desenvolvimento físico, anímico e espiritual do ser humano em formação. E os sete primeiros anos da criança, por exemplo, representam uma fase de grande dispêndio de energia para preparar toda uma condição física. Isso se evidencia no princípio da troca dos dentes e em um desenvolvimento neurológico e sensorial que tem sua expressão no domínio corporal, na linguagem oral, na fantasia, na inteligência.Contudo, é na atividade do brincar que essas capacidades são desenvolvidas com alegria e seriedade, com atenção e responsabilidade, com segurança e confiança em um mundo bom, que não exige da criança além de suas possibilidades, ou seja, uma entrada precoce no mundo adulto. E alfabetizar precocemente significa empurrar a criança para o mundo adulto (para o qual ela não está preparada, portanto) antes da hora, um gasto de energia que poderá fazer falta na vida futuradela.Em minha experiência docente, assim como psicopedagógica, sempre constato que, para uma criança pequena, o código alfabético é estéril, sem cor, sem beleza, pois é abstrato e desconhecido. Mesmo depois de alfabetizada, é o desenho que representa tão significativamente as suas vivências. Podemos verificar tal condição quando estudamos a escrita de nossos antepassados e a forma de comunicação de nossas crianças, o desenho. A escrita do povo egípcio, os hieróglifos, é a representação objetiva da realidade, ou seja, a re(a)presentação do mundo sensório pelo desenho. Mas quando em 3.000 a.C. surgiu a escrita fonética dos fenícios, ocorreu um distanciamento dessa forma de expressão, porque o fonema não tem mais relação direta com os elementos do mundo circundante.O desenho da criança é, portanto, a sua forma de comunicação natural, semelhante aos antigos egípcios, que revela seu universo infantil com o código que lhe é caro e próprio. Quando a sua criança lhe mostra um desenho que tenha feito, ela está lhe contando como vê o mundo, como se sente, se está alegre ou triste. Não é só a escrita que é capaz disso.Nas escolas Waldorf a alfabetização pelo código fonético inicia-se pelo desenho, de forma lenta e gradual, a partir dos 6 anos, mas o desenho e a pintura correm em paralelo por toda a escolaridade, como uma forma de comunicação tão importante quanto nossa linguagem escrita.A pedagogia Waldorf pressupõe que o professor, realizador dessa pedagogia, conheça o ser humano em seu desenvolvimento geral, respeite o contexto sociocultural em que o aluno está inserido e saiba organizar seu ensino privilegiando a brincadeira, o canto, a dança, para que a alfabetização (e qualquer outro conteúdo de ensino) tenha significado e seja efetiva.Entendemos o brincar como o princípio lúdico que embasa as atividades artísticas e orienta toda a prática docente, mas que também significa ou re-significa o ensino-aprendizado, pois é o motivo, o vínculo afetivo com o professor e com o conteúdo. Termino com a frase do filósofo Friedrich Schiller: “O homem só brinca ou joga enquanto é homem no pleno sentido da palavra, e só é homem enquanto brinca ou joga”.
DEPOIMENTOS DE PROFESSORAS WALDORF
No primeiro ano na verdade o que a gente precisa fazer constantemente é olhar o mundo, “se debruçar sobre ele” no que acontece no nosso redor, na natureza, nos seres da natureza, nas atividades cotidianas, nas atividades de trabalho artesanal. Esse é, principalmente, o nosso “alimento” para criar as histórias para alfabetização e encontrar elementos pictóricos no mundo que possam servir como material para alfabetização.
“a sensação que eu tive é que na verdade a gente não ensina a ler, eles é que aprendem a fazer e com o entusiasmo vão “acordando” para a aprendizagem”
Há uma ligação artística no aprender, na instância do pensar, sentir e querer. Você traz pra criança essa relação do sentir do eu gosto eu simpatizo e aí eu quero fazer e vou pensar sobre isso. Então é diferente nesse sentido.
Disponível em: http://www.namu.com.br/?q=materias/alfabetizacao-so-depois-dos-7-anos; http://ewrs.com.br/site/pedagogia-waldorf/; http://cwbh.com.br/img_materia/2c422f797212be4af65609f995fee873b204638dTeste%20Arquivo.pdf; http://www.colegiorudolfsteiner.com.br/perguntas-frequentes/; https://jardimflorescer.wordpress.com/2012/10/05/a-pedagogia-waldorf-alfabetizacao/; http://serwaldorf.blogspot.com.br/2014/05/a-alfabetizacao-na-pedagogia-waldorf.html. Acesso em: 12/09/2015.
Imagem disponível em: http://www.namu.com.br/?q=materias/alfabetizacao-so-depois-dos-7-anos. Acesso em: 12/09/2015.

7 comentários:

  1. Muito interessante, estou buscando entender mais sobre esse mundo da alfabetizaçao, pq minha filha está tendo dificuldades para ser alfabetizada, e eu estou perdendo a paciência, mas este texto me deu clareza que provavelmente ela só nao está madura o suficiente para entrara neste mundo tao racional da alfabetização. Ela é muito inteligente e ama desenhar, vou aproveitar este recurso para tentar ajudar-lá na alfabetização pra isto nao se torne algo pesaroso pra ela e pra mim. Muito grata pelo texto.

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  2. Fui aluna Waldorf e não fui alfabetizada sem mesas e cadeiras: elas estavam lá o tempo todo.
    Aliás a cópia estava presente pois precisamo de modelo do professor escrevendo tanto quanto outras crianças precisam. Tive cópia e ditados mas tive muito mais projetos e trabalhos de arte, é verdade!

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  3. Interessante o seu comentário, T. Elisa!!! Dê-nos mais informações, se possível... É sempre bom ouvir "o outro lado da história" para aprendermos mais. Como docentes, lendo as teorizações às vezes ignoramos muitas coisas. A sua experiência pode ser uma maneira de ressignificarmos as nossas ideias e concepções a respeito da Pedagogia Waldorf, daquilo que falam sobre ela para nós...

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  4. Como alfabetizar sem a configuração da sala de aula ( mobiliário, painéis , locais para as atividades artísticas ou não) ? Também sem a cópia dois elementos retirados da natureza e das histórias e de outras atividades artísticas e artesanais dos alfabetizandos? Sinto falta de uma listagem de atividades ( jogos) para dinamizar a aprendizagem da leitura e da escrita . Gostaria da descrição de uma técnica para dar rumo ao ensino - aprendizagem, facilitando o trabalho complexo e árduo do alfabetizador.

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  5. Como alfabetizar sem a configuração da sala de aula ( mobiliário, painéis , locais para as atividades artísticas ou não) ? Também sem a cópia dois elementos retirados da natureza e das histórias e de outras atividades artísticas e artesanais dos alfabetizandos? Sinto falta de uma listagem de atividades ( jogos) para dinamizar a aprendizagem da leitura e da escrita . Gostaria da descrição de uma técnica para dar rumo ao ensino - aprendizagem, facilitando o trabalho complexo e árduo do alfabetizador

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  6. Eu Aladyr Santos Lopes, professora alfabetizadora gostaria de uma resposta .

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